Crédito: Divulgação
"Tem dias que estamos bem e outros não. De fato, saber como é conviver com a doença é uma pergunta difícil". Esta é a resposta de uma pessoa portadora da Aids, doença causada pelo vírus HIV, que aceitou falar com a equipe do WebTerra, mas sem se identificar. O nome e a idade não serão divulgados.
Infelizmente o nosso personagem não é o único. O número de casos crescem na maior cidade do Norte de Minas. De acordo com dados divulgados pelo Centro de Referência de Doenças Infecciosas (Cerdi), em Montes Claros, até agora, já foram registrados 14 novos casos.
A coordenadora do Cerdi, Ivonete Cássia Pereira, afirma que o número informado pode ser ainda maior. "Recebemos boa parte da população da região para realizar o teste rápido, mas há também quem procure alternativas particulares para fazer os exames. Contudo, é possível dizer que a quantidade de portadores do HIV pode ser bem maior na cidade".
Em 2018, 102 casos de Aids foram confirmados pelo órgão municipal; já no ano seguinte o número cresceu para 115. Já na área de abrangência da Superintendência Regional de Saúde de Montes Claros, em 2018 foram notificados 149 casos de Aids e em 2019, este número saltou para 161 notificações. O último registro da doença em criança, na cidade, foi em 2018.
Com relação a sífilis, até agora já são 66 pessoas confirmadas com a doença. Em 2019, foram 333, sendo 71 destes transmitidos de mãe para filho. A coordenadora do Cerdi ressalta que os números são assustadores e alerta a gravidade que o caso deva ser tratado. "A população parece se preocupar mais com outras enfermidades do que com HIV. É preciso lembrar que, no caso da Aids, apesar do tratamento, a doença não tem cura".
O levantamento divulgado neste mês de março, pelo Boletim Epidemiológico HIV/Aids do Ministério da Saúde, mostra que apenas nos seis primeiros meses de 2019, mil casos de HIV foram registrados em Minas Gerais. De acordo com os números, nos últimos 20 anos, 55 mil mineiros foram infectados pela Aids, a quantidade equivale ao número de habitantes de uma cidade de porte médio, como Pirapora, no Norte de Minas.
Os casos de sífilis, de acordo com o estudo, também precisam de atenção. Só no primeiro semestre de 2019, foram mais de 7 mil ocorrências e nos últimos 10 anos quase 54 mil registros.
O Ministério da Saúde alerta que o uso dos preservativos está diminuindo entre pessoas de 15 a 29 anos. "A maioria das transmissões são de caráter sexual, principalmente entre homossexuais. Quando os pacientes chegam ao Centro de Referência e procuram o teste rápido, normalmente já tem o histórico de relações sem o uso de preservativos", ressalta a médica do Cerdi, Janer Aparecida Silveira.
Janer Aparecida trabalha há 20 anos com infectologia e explica que o HIV é um vírus que ataca o sistema imunológico. E para o tratamento da doença é realizado uma combinação de medicamentos conhecidos como terapia antirretroviral, que reduz a quantidade de vírus no sangue e não tem cura. O sexo desprotegido pode ser o ponta pé inicial para contrair a doença.
De acordo com a especialista o tratamento é eficaz para quem faz a adesão correta. "O uso dos remédios deve ser seguido risca, da maneira como é prescrita. São coquetéis para toda a vida. É preciso dizer que o comportamento do paciente deve mudar imediatamente após o diagnóstico".
O nosso personagem que preferiu não se identificar descobriu ser portador doença por meio do Hemominas, quando faria uma doação de sangue. "Desde que eu tome as medicações corretamente consigo viver bem, mesmo diante dos efeitos colaterais dos remédios".
Um exame eficiente que possibilita a detecção de doenças infecciosas e sexualmente transmissíveis em menos de 30 minutos, são os testes rápidos. Eles são de baixo custo operacional, altamente sensíveis e de simples aplicação e interpretação; é o que revela a referência técnica do Programa ISTAIDS na Superintendência Regional de Saúde de Montes Claros, Márcia Corrêa.
"A ampliação da testagem rápida na Atenção Primária é uma das estratégias elencadas no rol de prioridades da Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais, que vai de encontro às propostas do Ministério da Saúde, tendo como objetivo ampliação do acesso da população ao diagnóstico do HIV, bem como a detecção de sífilis e Hepatites B e C".
Ainda de acordo com a especialista, na região o processo de implantação dos testes rápidos nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) vem ocorrendo de forma gradativa. Cerca de 80% dos municípios já realizam os testes rápidos nos serviços de atenção primária à saúde.
"A adoção da testagem rápida proporciona o diagnóstico precoce, que é fator determinante da melhor resposta ao tratamento de infecções causadas pelo HIV, Sífilis e Hepatites. Dessa forma, quanto mais profissionais capacitados estiverem realizando os testes é provável termos um aumento nos diagnósticos das ISTs e, consequentemente, das notificações".
Em Montes Claros os portadores do vírus HIV contam com o Grupo de Apoio à Prevenção e aos Portadores da Aids (Grappa) entidade filantrópica fundada em 1992. Os assistidos contam com apoio psicológico e social, enfermagem, visita hospitalar e domiciliar, encaminhamento para exames e orientações sobre os serviços de saúde. Portadores de outros municípios são acolhidos na sede da instituição quando precisam realizar o tratamento em Montes Claros.
De acordo com a presidente do Grappa, Maurina da Silva Carvalho, 828 pessoas são cadastradas, entre portadores e familiares. Para ela, o maior desafio dos assistidos continua sendo o preconceito.
"Isso não acontece somente na sociedade, muitas vezes ocorre dentro do próprio vínculo familiar. Isso leva as pessoas vivendo com o HIV/Aids a terem dificuldade em aceitar a patologia, levando a uma possível não adesão ao tratamento. Infelizmente vivemos em uma sociedade que acredita que o vírus se pega no abraço, no copo, nos talheres, no fato de conviver. Temos que mudar isso".
O personagem que apresentamos no começo da reportagem é um dos assistidos pela entidade. Ele concorda que conviver com a doença se torna mais difícil pelo tabu da população, mas, segundo ele o Grappa tem ajudado a mudar essa realidade.
"Acredito que não é falta de conhecimento, mas sim preconceito. Isso é doloroso para nós, mas o que a sociedade não faz pelos portadores do HIV, a família Grappa faz por nós".
Pela segunda vez no mundo uma pessoa tem a cura do HIV confirmada. O estudo foi publicado pela revista The Lancet HIV. O paciente Adam Castillejo, do Reino Unido, está livre do vírus há dois anos. Isso ocorreu depois determinada a terapia antirretroviral e de já não haver necessidade de medicamentos.
De acordo com a publicação, ele foi submetido a um transplante de células estaminais, procedimento utilizado para tratar casos de linfoma. O doador tinha uma mutação conhecida como CCR5-delta 32, que o tornava resistente ao vírus da Aids.
Em 2011, um paciente de Berlin chamado Timothy Brown também ficou curado do vírus da Aids, três anos e meio depois de ter realizado um tratamento semelhante.
campanha prevenção aids
Carlos Alberto Jr.
17 de março de 2020
Webterra Notícias